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Phylloscartes roquettei (Snethlage, 1928), uma raridade em Curvelo


By Geraldo M. Pereira | abril 25, 2017 | Category Aves

“o cara-dourada, Phylloscartes roquettei, é uma espécie considerada criticamente ameaçada de extinção (IUCN, 2007) que permaneceu por mais de 50 anos conhecida apenas de sua localidade tipo em Minas Gerais (Brejo Januária), onde foi coletado em 1926 (Willis e Oniki, 1991).”
* Primeiros registros de Phylloscartes roquettei Snethlage, 1928, na Bahia, nordeste do Brasil 

A descoberta

Primeiro registro de P. roquettei feito em Curvelo. Foto: Maurílio Neto

Aos poucos, principalmente com o avanço da observação de aves como uma forma de lazer e maior interação com a natureza, a realidade sobre a ocorrência de espécies pouco conhecidas vem tomando novos contornos. 
Iniciativas como o Wikiaves e o Avistar Brasil em muito colaboram para que a sociedade, especializada ou não, se debruce sobre a importância de achamentos dessas espécies, sendo veículos expressivos de troca de conhecimento, principalmente sobre a suas reais localizações e o status conservacional de suas áreas de ocorrência. Dessa forma o mapa se preenche com novos encontros e o de Curvelo – como nos alertou o experiente ornitólogo Wagner Nogueira, que mais cedo ou mais tarde estaríamos frente a frente com essa incrível espécie – vem se somar colaborando com o conhecimento sobre a sua abrangência territorial. Assim, encontrar o cara-dourada – Phylloscartes roquettei (Snethlage, 1928) – foi uma surpresa sem igual, incomensurável, mas previsível. Estamos em uma região fitogeográfica onde a ocorrência de P. roquettei é obrigatória, embora seus hábitos discretos e sua natural raridade – e a destruição em massa do seu habitat – sejam empecilhos que por vezes desencorajam a imaginar a possibilidade de encontrá-lo.  


A descoberta ocorreu devido a um erro cometido por Maurílio Neto e eu algumas semanas antes ao guiarmos os amigos de Santo Antônio do Monte – Paulo Couto, Alysson Silva, Daniel Santos, Wiliam Silveira, Luis Henrique e de Pompéu – Luiz Alberto e Afonso Carlos em busca do urubu-rei na Lapa do Mosquito. Como ocorre com qualquer passarinheiro, que pelo menos uma vez na vida  equívoca-se com os caminhos, levando muitas vezes pelo excesso de confiança os seus convidados a estradas diversas àquelas usuais, dando aquele frio na barriga por ter errado um itinerário que para ele tornou-se deveras trivial. Acabou que esse erro se mostrou bastante adequado, já que diversas espécies novas foram encontradas e catalogadas para o município de Curvelo. Aquela matinha entre eucaliptos perto da qual paramos foi uma desforra e um alento enquanto Maurílio me dizia o que havia acontecido por termos errado a estrada para a lapa. Nesse meio tempo parado o amigo de Samonte, Alysson Silva, conseguiu o registro do arapaçu-verde (Sittasomus griseicapillus – Vieillot, 1818) – que ainda hoje é o único para a cidade. Por fim as novidades daquele trecho se esgotaram e seguimos em frente pela estrada até encontrarmos o correto trajeto para aquela que é uma das mais belas descobertas de Peter Lund.

Passado aquele dia nos incomodava o fato de não termos conseguido registrar o arapaçu-verde. O amigo Antonio Augusto Nery, o Augustinho, ao ver quantas novidades havíamos registrado imediatamente entrou em contato e marcamos uma volta àquele local, principalmente por causa da marianinha-amarela. Tínhamos que fotografar, Maurílio e eu aquele danado Sittasomus griseicapillus…
Algo maior, porém, nos esperava. No fim de semana posterior, um domingo cinza pré outonal, saímos bem cedo e a nossa intenção era clara: encontrar as espécies marianinha amarela (Capsiempis flaveola – Lichtenstein, 1823) arapaçu-verde (S. griseicapillus) e o papa-moscas-cinzento (Contopus cinereus – Spix, 1825) para que Augustinho pudesse registrá-las. Para Maurílio e eu era a chance de melhorar nossos registros e mais uma oportunidade de tentar observar o arapaçu. Chegamos ao local dessa vez sem atropelos, logo a marianinha-amarela deu as caras e fizemos alguns bons registros, Augustinho muito feliz por ter conseguido mais esse belo lifer – termo pelo qual os passarinheiros denominam as espécies por eles primeiramente visualizadas ou registradas.

Entramos pelas estradinhas que recortam as matas atentos a todos os sinais. Eu de quando em quando chamando no playback o S. griseicapillus. Maurílio, que tem olho biônico, com uma visão bastante apurada para longas distâncias, visualizou pela primeira vez o nosso pequeno Rhynchocyclidae bem lá no cimo da copa mais alta e densa do lado de um pequeno beija-flor que era naquele momento o nosso foco. No instante que vi a espécie pela lente de sua câmera –  e naquele sábado apenas ele conseguiu registrá-lo – já sabia que estávamos diante de algo no mínimo diferente do que era usual encontrarmos em nossas andanças Curvelo afora. Augustinho aventou de ser o bico-chato-amarelo (Tolmomyias flaviventris – Wied, 1831), para mim era piolhinho-do-grotão (Phyllomyias reiseri – Hellmayr, 1905). Maurílio questionava incrédulo o porque de não termos fotografado. Marianinha-amarela – pensei comigo. Fomos embora com a certeza de que tínhamos registrado algo diferente, apenas isso. Chegando em casa mandei mensagem para Maurílio – que só queria saber do Trochilidae que para mim não passava de um Amazilia fimbriata (Gmelin, 1788). “Maurílio, larga esse beija-flor pra lá e foca naquele amarelinho, manda pro Wagner Nogueira e pro Paulo Couto!”. Mas ele insistia naquele pequeno beija-flor… Liguei para Augustinho para falar das minhas suspeitas sobre a pequena ave amarelinha, para mim, naquele momento era piolhinho-do-grotão. Logo o Maurílio retorna com uma mensagem reveladora, algo além de P. reiseri tinha sido descoberto! Paulo Couto havia confirmado: “Na verdade é outra raridade: cara dourada – Phylloscartes roquettei“.

Pronto, tínhamos a certeza, algo de extrema importância acabara de ser encontrado em Curvelo! Fiquei deveras extasiado, porém mais contente com a afirmação de que o esperado havia acontecido. Liguei para Augustinho e marcamos de voltar lá no dia seguinte. Por mensagem contatei Maurílio, e no outro dia, um domingo de manhã amena que vai se multiplicando em um calor obsceno, como é feitio da temperatura em Curvelo, estávamos apostos para rever a incrível descoberta. Será que iria aparecer? Na nossa cabeça, como é veiculado, espécie que acompanha bando não costuma marcar ponto, temos sempre a impressão de movimento, de que o bando misto é sempre um “de passagem”, a melhor paragem é sempre a próxima. Nos ajeitamos por ali e comecei o tocar o playback. Não demorou muito e lá estavam, quatro indivíduos da espécie vindos das alturas de uma grota, entre as folhagens mais densas e se aproximando timidamente, apesar da agitação de um deles. Seriam dois casais ou uma família com pais e filhos? Aparentemente todos eram adultos e esse mais exaltado se aproximava com mais energia – era ele, portanto, o alvo de nossas câmeras. Fizemos boas fotos e voltamos felizes com a afirmação. Faltava, portanto, confirmar a residência da espécie naquele ponto. Duas semanas depois voltamos Maurílio e eu no mesmo local e mais uma vez P. roquettei nos brindou. Voltei convencido de que, se não estiver nidificando, aquele é o lugar em que sempre vamos encontrar uma família dessa bela avezinha dourada que leva no estrangeiro a alcunha reverenciando o nosso gerais querido: minas gerais tyrannulet!

Abaixo: Vocalização do cara-dourada – Phylloscartes roquettei (Snethlage, 1928) gravada em Curvelo pelo amigo Marcio Nery.

Encontrar o cara dourada foi uma questão de sorte? Avalio que não.  Sorte, ao meu ver, até faz parte de passarinhar, mas quando você se dispõe a fazer algo com alegria e prazer, é fato que será recompensado com grandes momentos e grandes descobertas, estando para sempre em sua vida a lembrança de que algo de muito especial aconteceu e foram a sua curiosidade e satisfação que proporcionaram pequenos e eternamente agradáveis momentos de aprazimento. 

* Revista Brasileira de Ornitologia, 17(3-4):217-219 – Sidnei Sampaio dos Santos, Francisco Pedro da Fonseca Neto, José Fernando Pacheco, Ricardo Parrini e Guilherme Alves Serpa.


Phylloscartes roquettei

Classificação Científica
Reino:
Animalia
Filo: 
Chordata
Classe:
Aves
Ordem:
Passeriformes
Subordem:
Tyranni
Parvordem:
Tyrannida
Superfamília:
Tyrannoidea
Família:
Rhynchocyclidae
Subfamília:
Pipromorphinae

Espécie:
P. roquettei

Nome Ciêntifico:
Phylloscartes roquettei
Snethlage, 1928

Cara dourada ou minas gerais tyrannulet para aqueles que falam a língua da rainha, Phylloscartes roquettei (Snethlage, 1928) é uma pequena ave da família Rhynchocyclidae (Berlepsch, 1907) cuja principal característica que a diferencia dos demais membros do seu Gênero é a coloração amarelo ocre da região supraloral, bem como a testa amarelada.
Pouco se sabe quanto ao seu hábito alimentar, nas observações que fizemos em Curvelo foi possível percebê-lo forrageando nas copas altas bem como executando voos rápidos como que à cata de alguma pequena presa. Não presenciamos o ato alimentar em si, mas pode-se afirmar que pequenos artrópodes são a base de sua dieta.
Um dos indivíduos se mostrou bastante estimulado ao playback, aproximando-se demasiadamente perto da fonte emissora e perseguindo os outros três indivíduos quando eles também se aproximavam. Essa ação pode caracterizar uma hierarquia predominando um macho dominante. Não descarta-se contudo a hipótese de serem os outros indivíduos fêmeas ou jovens e o indivíduo arredio demonstrava em sua ação instinto de cuidado parental. Sidnei Sampaio dos Santos et al. observou situação semelhante:

“Em cinco ocasiões, emitimos o “playback” do canto para estimular resposta comportamental ou vocal, mas apenas um indivíduo se aproximou, deslocando-se pelas copas e emitindo cantos e chamados por quase dois minutos. Em seguida, ele retornou às atividades de forrageio sem manifestar nenhuma resposta ao “playback”.”

Para não causar desarmonia o playback foi utilizado por pouco tempo e deixamos as proximidades da área após os registros fotográficos e observações complementares para coleta de dados.
Consta nos registros que a espécie participa de bandos mistos, contudo, nas observações feitas em Curvelo, as demais espécies demonstraram maior dispersão na área, locomovendo-se ou ocorrendo em pontos diversos ao em que em todas as oportunidades Phylloscartes roquettei foi notado. As nossas análises sugerem que P. roquettei realmente acompanha bandos mistos, mas não se afasta longas distâncias de sua área padrão. Para confirmar esta hipótese estudos mais detalhados devem ser realizados.

P. roquettei permanece o tempo todo imperceptível nas partes mais altas das árvores e, quando outra ave do bando misto se manifesta com vocalizações de alerta ou o playback de uma delas é tocado limita-se a se aproximar sem alarde. Contudo, ao ouvir a vocalização  de sua espécie, seja de outro emissor ou playback, torna-se agitado e causa ainda mais alvoroço nas demais, indício de que o seu nervosismo é interpretado como claro sinal de ameaça pelos demais, já que a sua natureza é ser discreto. Passado o tempo de exposição à emissão vocal passa a ignorá-la, ao menos se estiver na presença de outros indivíduos da sua espécie.

As notas acima são relativas ao período final do verão, coletadas nas primeiras horas da manhã, já no início do outono em uma tarde por cerca de quinze minutos de observação após a aproximação da espécie um indivíduo apenas se limitou a vigiar o playback mas sem demonstrar maior agitação e sequer vocalizou. Isso nos leva a entender que o período de maior atividade e alerta de P. roquettei é o horário da manhã, 

Foram encontradas as seguintes espécies teoricamente formando bando misto com P. roquettei ou que foram atraídas pela sua agitação: saíra-amarela – Tangara cayana (Linnaeus, 1766), fruxu-do-cerradão – Neopelma pallescens (Lafresnaye, 1853), mariquita – Setophaga pitiayumi (Vieillot, 1817), saí-azul – Dacnis cayana (Linnaeus, 1766), sabiá-barranco – Turdus leucomelas (Vieillot, 1818), cabeçudo –  Leptopogon amaurocephalus (Tschudi, 1846), beija-flor-de-garganta-verde – Amazilia fimbriata (Gmelin, 1788), chorozinho-de-chapéu-preto – Herpsilochmus atricapillus (Pelze), 1868, choca-do-planalto – Thamnophilus pelzelni (Hellmayr, 1924), pula-pula – Basileuterus culicivorus (Deppe, 1830). Curiosamente, embora habitem ou se manifestaram em áreas próximas, a marianinha-amarela – Capsiempis flaveola (Lichtenstein, 1823) não demostrou nenhum comportamento quanto a agitação do cara-dourada ou ao playback desta espécie.

Emilie Snethlage, a senhorinha doutora da ornitologia brasileira

Na obra Emília Snethlage (1868-1929): o heroísmo como estratégia de legitimação da ciência, *Miriam Junghans questiona: “será que, para uma mulher ser reconhecida como cientista no início do século XX, era necessário demonstrar bravura e coragem física? E por que seria essa uma maneira de ter reconhecido o valor do seu trabalho?” Para Emilie Snethlage essa foi uma questão chave em sua formação, numa época em que subjugar a figura feminina soava tão natural quanto o bater de asas de uma ave. Por isso precisou demover com a amostra incontestável de seu conhecimento e talento toda uma visão machista da sociedade de um período extremamente apegado à figura do homem provedor e da mulher como unicamente do lar, que devia manter distância da acadêmia e consequentemente da ciência. Era, dessa forma, uma mulher atemporal. Conseguiu não somente doutorar-se com a maior das honras – summa cum laude – como chegou a ensinar na instituição na qual, para ser aceita como acadêmica devia chegar às aulas antes dos demais e esconder-se por trás de um biombo. Não obstante, após conseguir o reconhecimento de seus pares em sua terra natal, se viu imersa em um outro desafio: ocupar um cargo no Museu Emilio Goeldi – hoje Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), em um Brasil ainda profundamente patriarcal e averso a completa emancipação feminina. Snethlage não somente assumiu e desempenhou com maestria as suas funções como promoveu uma revisão dos espécimes constantes no catálogo do museu e ainda encabeçou expedições para áreas remotas e desconhecidas do Brasil.

Este indivíduo foi encontrado na cidade de Presidente Juscelino – MG, no dia
30/04/2017, marcando mais um local de ocorrência desta importante espécie da
nossa avifauna.

Ao inventariar 1.117 espécies de aves em anos de incansável labuta, criou um marco histórico para a ornitologia brasileira, sendo ainda hoje referência para o conhecimento ornitológico do país.
É, pela sua história, coragem e dinamismo uma das mais emblemáticas figuras da nossa ciência, nos apresentando a um país de cores, formas e cantos transmutado em penas, bicos, ninhos e diversidade. 

Snethlage publicou quarenta e três artigos científicos, destacando-se entre eles o “Catálogo das aves amazônicas”.
O nome científico do cara-dourada é composto pelo nome genérico Phylloscartes: phullon = folha; e de skairö = pular, dançar, e pelo epíteto específico roquettei, uma homenagem prestada por Emilie Snethlage a Edgard Roquete-Pinto, importante comunicador brasileiro que dirigiu o Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde se conheceram e se tornaram colegas de trabalho e nutriram profundo respeito pela vida e obra um do outro.
Em homenagem a Snethlage a espécie tiriba-do-madeira recebeu o nome científico Pyrrhura snethlageae (Joseph & Bates, 2002).

*Miriam Junghans: Mestre em História das Ciências pela Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz – RJ, a quem agradecemos profundamente a generosidade na confiança depositada ao autorizar a utilização de seu trabalho como base bibliográfica para esse artigo. 


As ameaças à espécie e a importância das reservas florestais

P. roquettei alimentando-se. Foto: Rodrigo Quadros

A área onde Phylloscartes roquettei (Snethlage, 1928) foi encontrado em Curvelo está compreendida na bacia hidrográfica do Rio das Velhas no contexto da região da Lapa do Mosquito, em que ocorre naturalmente o cerrado senso estrito com pontos de mata de galeria, os chamados grotões, e intermitência de outros contextos importantes, como o campo sujo, campo limpo e florestas estacionais deciduais – as chamadas matas secas, clima seco predominante e temperatura média de 28ºC, sendo um novo ponto significativo de ocorrência a ser referenciado, estando em conjunto com os registros realizados na cidade de Corinto, destacando-se essas como áreas de interesse para ações de conservação e preservação. O local exato corresponde a uma mata de galeria fragmentada entre plantações de eucalipto, o que demonstra uma certa diversificação de habitat, já mencionado por Marcelo Alejandro Villegas Vallejos e Leonardo Rafael Deconto em Phylloscartes roquettei em Goiás: notas biológicas, biogeográficas e conservacionistas:

“Embora seja considerada uma espécie com sensibilidade razoável (Parker et al. 1996), já foi registrada em ambientes secundários e florestas fragmentadas (Lopes et al. 2008), além de uma observação isolada explorando momentaneamente uma cultura de algodão (Willis & Oniki 1991), fatos que apontam certa flexibilidade ecológica.”

 Abaixo: vegetal onde P. roquettei foi encontrado em Curvelo

Como na área de ocorrência de P. roquettei em Curvelo predomina a mata de galeria torna-se fundamental a não interferência humana, objetivando assim a perpetuação da espécie. A similaridade entre matas secas e matas de galeria, pontos que correspondem às áreas de ocorrência características da espécie, explica de certa forma a dinâmica de permanência de P. roquettei nesse nichos, dando a eles singular importância quanto à sua preservação; porém, um fator interessante está nessa questão das áreas de ocorrência definidas para P. roquettei, condicionantes fitogeográficas normalmente delegadas a uma condição inferior pelas populações locais e desmatadas comumente para o uso da madeira como “lenha” para fornalhas, isso desconsiderando a ação de grandes empresas e fazendeiros que desmatam para a monocultura ou criação de gado, maiores ameaças para a espécie na região.
Nota Luciano Moreira-Lima na dissertação Aves da Mata Atlântica: riqueza, composição, status, endemismos e conservação, pag414 que:

“Seu tratamento como uma espécie da Mata Atlântica, em oposição ao apontado por outros autores que a consideram a espécie endêmica do cerrado (Lopes 2009), justifica-se pelo fato dela ocorrer nas florestas estacionais associadas ao rio São Francisco que de acordo com os limites nesse trabalho são consideradas como parte da Mata Atlântica”

No trabalho citado acima Luciano Moreira-Lima aponta as florestas estacionais deciduais e semideciduais como áreas de mata atlântica, o que é corroborado pelo Decreto Federal 750/93 que diz “as formações florestais e ecossistemas associados inseridos no domínio Mata Atlântica, com as respectivas delimitações estabelecidas pelo Mapa de Vegetação do Brasil do IBGE: Floresta Ombrófila Densa Atlântica, Floresta Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Estacional Decidual, manguezais, restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste”. 
De outra forma, em Aves da Pátria da Leari, Pedro C. Lima cita que:

“Como realizações das expedições empreendidas por Snethlage, podemos citar a descrição de três táxons: Xiphocolaptes franciscanus, Phylloscartes roquettei e Knipolegus aterrimus franciscanus. Essas três formas permanecem como endêmicas no bioma da Caatinga.”

Nota-se em Curvelo e região bem claramente a presença de ambas fitofisionomias muitas vezes associadas ao cerrado, contrapondo-se entre si em diversas faixas de transição muito bem delineadas, havendo comumente os chamados grotões. Esses fatores levam a um entendimento de que o cara-dourada possa ocorrer em locais diversos àquele onde foi encontrado no município.

Achados como esse demonstram a importância das áreas de conservação e preservação permanentes que as empresas de monocultura são obrigadas por força de lei  a manter. Mas não basta manter as áreas de preservação, é necessário que elas se comuniquem formando corredores ecológicos, possibilitando dessa forma a integração e interação mais harmoniosa (dentro do possível claro, em si tratando de ambientes enclausurados entre a imensidão verde e deserta da monocultura). As áreas de preservação são notadas em Curvelo e, aparentemente, as empresas mantêm um controle inclusive quanto ao acesso a essas áreas, não raramente interpelando aqueles que nelas se aventuram afim de atestar que a integridade do local não seja violada.
O cara-dourada agradece.

Agradecimentos: Ao ornitólogo e moderador do site Wikiaves Wagner Nogueira pela ajuda nas pesquisas e indicação de fontes de pesquisa; à mestre em História das Ciências pela Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz – RJ Miriam Junghans pela autorização em utilizar o seu trabalho Emília Snethlage (1868-1929): o heroísmo como estratégia de legitimação da ciência como base bibliográfica para esta publicação; aos amigos Maurilio Neto e Antonio Augusto Nery pelas pesquisas de campo e registros fotográficos; ao amigo Paulo Couto pela prestatividade sempre demonstrada ao nos ajudar na identificação das espécies que nos fazem quebrar a cabeça. Ao amigo Marcio Nery pela autorização em utilizar a gravação do cara dourada feita em Curvelo.


Saiba mais: Wikiaves, Bird Life International, Revista Brasileira de Ornitologia – Sidnei Sampaio dos Santos, Francisco Pedro da Fonseca Neto, José Fernando Pacheco, Ricardo Parrini e Guilherme Alves Serpa, Primeiros registros de Phylloscartes roquettei Snethlage, 1928, na Bahia, nordeste do Brasil, Marcelo Alejandro Villegas Vallejos1, & Leonardo Rafael Deconto, Phylloscartes roquettei em Goiás: notas biológicas, biogeográficas e conservacionistas, Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção – 2003 – Descrição da Espécie, The Cornell Lab of Ornitology – Neotropical Birds, Anexo à Instrução Normativa n° 3, de 27 de maio de 2003, do Ministério do Meio Ambiente Lista das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção, Lista das espécies terrestres da fauna brasileira  ameaçadas de extinção segundo o workshop da Fundação Biodiversitas de dezembro de 2002 com categoria UICN, Conceito atual e nomenclatura e revista das aves alistadas no “catalogo” de E. Snethlage, Conexão Planeta: Emilie Snethlage, cientista pioneira no Brasil: uma mulher inspiradora, Wikipedia, Among birds and net(work)s: material and social practices in the trajectory of ornithologist Emilie Snethlage (1868–1929) – Miriam Junghans, Doctoral candidate at Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, Rio de Janeiro, Biota Neotrop. vol.9 no.3 Campinas July/Sept. 2009 – Aves da Fazenda Brejão: uma área prioritária para conservação do Cerrado no noroeste de Minas Gerais, Brasil, Livro vermelho da fauna brasileira ameaçada de extinção, Museu Emilio Goeldi – Conceito atual e nomenclatura e revista das aves alistadas no “catalogo” de E. Snethlage, New data concerning the distribution, behaviour, ecology and taxonomic relationships of Minas Gerais Tyrannulet Phylloscartes roquettei – Marcos A. Raposo, Juan Mazar Barnett, Guy M. Kirwan e Ricardo Parrini, Estudo de impacto ambiental (EIA) das obras de implantação da Ferrovia Oeste Leste (EF 334) entre Figueirópolis (TO) e Ilhéus (BA), Geographic distribution, habitat association, and conservation status of the Critically Endangered Minas Gerais Tyrannulet Phylloscartes roquettei, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos Decreto nº 750, de 10 de fevereiro de 1993, revogado pelo Decreto nº 6.660, de 2008, Phylloscartes roquettei em Goiás: notas biológicas, biogeográficas e conservacionistas – Marcelo Alejandro Villegas Vallejos e Leonardo Rafael Deconto, Biblioteca Digital Curt Nimuendajú, UFSM – Centro de ciências naturais e exatas. Franchesco Della Flora, Progrma de pós-graduação em Biodiversidade Animal – Interações ecológicas e filogenéticas em bandos mistos de aves do Pantanal, Cerrado e Floresta Atlântica
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